segunda-feira, 31 de março de 2008

Divórcio litigioso

Resolveram alguns Deputados apresentar propostas no sentido de facilitar o divórcio aos portugueses. A situação actual é bem conhecida. Quando uma pessoa casada pretende pôr fim à relação matrimonial, tem hoje duas soluções: ou obtém o consentimento do cônjuge, e ver-se-á divorciada em breve prazo e a custo razoável; ou não o obtém, e terá, para se divorciar, de provar que a culpa da situação é do cônjuge e de pagar muito, em tempo e em dinheiro, para se divorciar.
Esta situação é duplamente injusta. Por um lado, prolonga desnecessariamente situações de conflito que são dolorosas, e, por outro, protegem os fortes. Quer dizer, num casal em que um dos cônjuges tenha rendimentos próprios e o outro não, ou se houver uma diferença muito sensível entre os dois, o mais rico pode, e muitas vezes fá-lo, prolongar quase indefinidamente os processos, tornando a vida do outro num inferno.
O Bengalão não conhece os projectos em discussão. Não sabe, assim, se alguns problemas são correctamente tratados. Mas sabe que, em princípio, o objectivo deles é justo e corresponde a uma prática social que tem feito com que o casamento já não seja a única maneira de constituir uma família e seja mesmo cada vez menos o acto constitutivo de uma família. Cada vez há mais pessoas que não consideram que o casamento seja uma condição prévia para duas pessoas iniciarem uma vida em comum. Cada vez menos pessoas consideram, assim, o casamento como acto fundador e sagrado.
O Bengalão tem a sua opinião. Mas trata-se de uma questão que é do domínio privado de cada um. A opinião d'O Bengalão não tem qualquer interesse, a não ser para si próprio e para a pessoa com quem partilha, e tem toda a intenção de continuar a partilhar a sua vida. Não tem interesse a opinião d'O Bengalão nem a de ninguém. Que o Estado deve proteger e salvaguardar o direito de alguns cidadãos, que acreditam que o casamento é sagrado, de celebrarem o matrimónio de acordo com essa crença é uma evidência. Que o Estado, ou seja quem fôr, tenha o direito de definir as condições da dignidade do casamento seria um desvio intolerável.
Ora a Igreja Católica entendeu pronunciar-se sobre o assunto. Tem a Igreja o direito de se pronunciar? Claro que sim. Desde que aceite as condições que governam a convivência num Estado de Direito. Ou seja, que a Igreja Católica aceite que deve, e pode, informar os seus fiéis das condições em que considera que eles podem casar ou separar-se. Se a Igreja Católica acha que os noivos, para casarem devem fazer o pino diante da Sé de Lisboa, pode e deve dizê-lo. Se a Igreja Católica acha que, para um casal se separar é necessário que um dos cônjuges seja Príncipe do Mónaco, pode e deve dizê-lo. O que a Igreja Católica não pode, nem deve, é tentar fazer com que o Estado consagre na Lei as crenças do Senhor Ratzinger. Para os Católicos, as crenças deste estimável Senhor são a Verdade com letra grande. Para O Bengalão, e para o Estado laico, as crenças do Senhor Ratzinger são do domínio estritamente privado.
Mas a Igreja Católica não aprende. Mesmo depois de séculos a tentar que toda a gente pense como ela, com resultados que, felizmente, estão longe de ser muito bons, ainda não aprendeu.
Ora meta-se a Igreja Católica na sua vida e deixe o governo da vida comum de todos os cidadãos a quem estes decidirem. Continue a Igreja a dizer aos seus membros as suas regras, mas deixe os outros cidadãos em paz. O Bengalão está farto de quem, em nome da iluminação divina pretende que a sua Ética é superior à ética d'O Bengalão, que os seus Princípios são superiores aos princípios d'O Bengalão, que a sua Moral é superior à moral d'O Bengalão.
E, por uma vez que o Ingenhêro assina um projecto de jeito, se é que o projecto é dele, deixe o homem trabalhar.

domingo, 30 de março de 2008

Quadro de Mobilidade

Os factos são claros: Vai ser criado um Quadro de mobilidade especial para Professores. Quer dizer, os Professores que, por motivos de saúde, não possam exercer funções docentes, sem estarem incapacitados para o trabalho, serão colocados num quadro especial e convidados a procurar encontrar outra possibilidade de trabalharem e justificarem, assim, o vencimento que continuam a receber. Como é natural, os Sindicatos de Professores protestaram.
Entendamo-nos, Leitor. Quando O Bengalão diz "como é natural", não quer de modo algum dizer que está de acordo com a opinião dos Sindicatos. O Bengalão acha perfeitamente normal que um Professor que, por razões de saúde, não possa ensinar, apesar de poder exercer outras funções, as exerça, desde que elas estejam de acordo com a sua formação e capacidades e que correspondam ao mesmo nível de responsabilidades que as de um Professor. De facto, não vê O Bengalão por que há-de continuar a pagar a um seu funcionário, apto para trabalhar mas inapto para exercer determinadas funções, desde que lhe ofereça a possibilidade de, sem se afastar muito do seu lugar de titularização, como defendem as convenções da OIT de que Portugal é signatário, usar e desenvolver as suas capacidades e conhecimentos, e manter o mesmo nível de responsabilidade.
O Bengalão acha que é natural que os Sindicatos protestem, porque os Sindicatos defendem interesses sectoriais, não defendem os interesses da generalidade dos cidadãos. O Bengalão, que, para além dos interesses dos Professores, vê também os interesses de quem lhes paga, tem uma opinião diferente.
Claro que, às vezes, numa negociação laboral, uma das partes oferece à outra algumas condições especiais, para a compensar de aspectos particularmente duros da sua profissão. É o que acontece, por exemplo, com os Deputados. As condições de trabalho dos Deputados são negociadas entre o legislador e o trabalhador. Isto é, entre o Deputado e o Deputado. Para compensar o Deputado das condições particularmente duras do trabalho do Deputado, o Deputado oferece ao Deputado, por exemplo, condições de reforma extremamente aliciantes.
Terá sido isto que aconteceu no caso dos Professores? Terá quem para isso tem poderes, considerando as condições, que lhe pareceram duras, do trabalho dos Professores, lhes terá oferecido, como compensação, a não aplicação da regra geral ao seu caso? Porque se assim foi, o caso muda de figura. O que seria apenas a aplicação, aos Professores, de uma norma geral, passaria a ser o rompimento intolerável de um contrato.
Ora é isto mesmo que dizem os Professores. E dizem mais do que isso. Dizem que a Lurdinhas, além de ter assumido este compromisso, foi mesmo à Assembleia da República dizer que não haveria quadro de mobilidade especial para os Professores. O Bengalão, que, como já disse, não faz suas as reivindicações sectoriais de uma classe profissional a que não pertence, tem, sobre este comportamento de quem eu seu nome age, o direito de ter uma opinião. E O Bengalão procurou, assim, saber se era verdade aquilo de que era acusada a Lurdinhas.
É verdade que mentir aos Sindicatos e mentir à Assembleia da República não é exactamente a mesma coisa. No primeiro caso, a empregada d'O Bengalão, em nome d'O Bengalão, teria enganado alguém com quem, em representação d'O Bengalão, negociava. No segundo, teria mentido ao seu próprio patrão, porque as perguntas que O Bengalão faz aos seus servidores (é o que quer dizer ministro), as faz através da Assembleia da República. O Bengalão envergonha-se se os seus empregados não forem pessoas de bem. E, se mentem àqueles com quem negoceiam, não são pessoas de bem. O Bengalão não admite que os seus criados lhe mintam. E espera dos seus procuradores, na AR, façam o que se lhes exige, se a mentira se confirmar.
A Lurdinhas, entretanto, explicou-se. Disse a ilustre almofalense a seguinte enormidade: que, quando disse que não haveria quadro de mobilidade para Professores, estava apenas a referir-se a quem exercia funções docentes. Quer dizer, para a Lurdinhas, Professor não é uma profissão, é uma função. Ou seja, que, durante o tempo em que não dava aulas, um Professor deixava de o ser. E, quando disse que não haveria QM para Professores, estava a dizer o seguinte: se, por hipótese académica, fosse criado um QM para Professores, os Professores (ou seja, os que estão a dar aulas) não iriam para lá, porque, estando a dar aulas, não se lhes aplicaria a mobilidade. Quem fosse para lá, não estaria a dar aulas, e portanto, não seria Professor. Com esta definição, a Lurdinhas mostrou que, para além daquilo que já todos tínhamos visto, está ao nível daquilo a que, na longínqua juventude d'O Bengalão, se chamava um pantomineiro: um vendedor de banha da cobra com uma língua mais virtuosa do que o produto que vendia.

quarta-feira, 26 de março de 2008

Jamé

O Bengalão ouviu o Ministro Jamé garantir que a decisão sobre o traçado da via de alta velocidade já tinha sido tomada. Ora O Bengalão não deu fé de que a CIP tenha publicado o seu relatório. O Bengalão anda cada vez mais distraído. E por isso te pede humildemente desculpa, Leitor.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Casamento e Impostos

O Bengalão leu no Público. Não foi um sonho, nem foi um filme do Gato Fedorento no You Tube. O Bengalão leu no Público. Estava lá preto no branco. O fisco anda a enviar cartas ameaçadoras a contribuintes recém casados a fazer perguntas indiscretas. Quantos convidados, quanto custou o vestido de noiva, quanto custou o almoço, se calhar que prendas deu cada um e onde as comprou. E ainda se houve outros eventos no mesmo dia no mesmo local. O Bengalão aproveita para chamar a atenção das suas amigas feministas para o facto de o fisco estar muito interessado no preço do vestido da noiva, mas ignorar por completo o preço do smoking do noivo. O machismo revela-se nos actos mais banais. A eles, companheiras!
O Bengalão leu e ouviu muitos comentários indignados a esta carta do fisco. Que o segredo, que a intimidade, que qualquer dia vai a ASAE verificar se os noivos, no quarto, findo o banquete, fizeram o que tinham a fazer nas regras da arte.
Ora O Bengalão pensa que estes comentadores dão, todos eles, provas de enorme ingenuidade. O Bengalão explica. Perguntar a alguém que prenda uma pessoa lhe deu, onde foi comprada e quanto custou, ou perguntar aos noivos quanto custou e como foi pago um banquete que a boa tradição portuguesa manda que os pais paguem, e não os noivos, perguntar a uma noiva quanto custou o vestido que a tornou na mulher mais bonita do mundo, só pode resultar ou de uma ignorância e insensibilidade descomunais, mesmo para os altíssimos parâmetros do fisco, ou de um objectivo bem definido e oculto. Perguntar a uns noivos se houve, no mesmo dia e no mesmo local outros eventos, como se os noivos estivessem para pensar noutros eventos no dia em que se casam, só se compreende ou de alguém extremamente estúpido, ou de alguém com um objectivo oculto e bem definido.
O Bengalão, este cínico coriáceo, sabe que, de duas explicações aparentemente possíveis, a mais provável é a mais simples. Pensa, assim, que a explicação mais provável é que, por detrás desta carta do fisco esteja, portanto, um objectivo oculto e bem definido. Ninguém acredita que um responsável, mesmo licenciado pela Universidade Independente, resolva fazer estas perguntas e estas ameaças para obter informações. O objectivo das cartinhas deve ser, portanto, outro.
Mas qual pode ser o objectivo do fisco, ao enviar estas cartas, se não é o da obtenção de informações? Para responder a esta pergunta, O Bengalão aconselha a bem conhecida estratégia do Alho Porro, inventada pela conhecida Agatha Christie. Interroguemo-nos, assim: cui bonus? Ou seja, quem tem a ganhar com isto?
Parece evidente que esta carta levará à ridicularização do fisco, à sua desacreditação. Pois que outra consequência pode ter uma manobra aparentemente tão inábil, tão estulta, tão brutal?
Portanto, cui bonus? A quem aproveita esta ridicularização e esta desacreditação? A resposta só pode ser uma: a quem, de forma sistemática e premeditada, foge ao fisco. A organizações criminosas, pois.
Segue-se a conclusão. O Bengalão suspeita que o fisco, sabe-se lá a que nível, tenha sido infiltrado por alguma tenebrosa organização criminosa com um plano maquiavélico: destruir, quem sabe se para sempre, a credibilidade da Fazenda, para melhor poderem continuar as suas práticas.
À atenção do Senhor Ministro das Finanças.

A Inocência dos Talibans

Acalma-te, Leitor. Quando O Bengalão deixa entrever que considera os Talibans inocentes, não afirma com isso que ache que eles sejam inóxios, palavra que, como tu bem sabes, significa probos, sem culpa. Não. Nem O Bengalão se acha capaz de determinar a culpa de seja quem for, mesmo de Talibans. O que O Bengalão quer dizer é que eles são ingénuos, ignaros, que são outros sentidos da palavra inocentes. Todos os Talibans são ingénuos. Acreditam que conhecem a verdade. E que a verdade (eles dizem a Verdade) é fácil de adquirir. Basta ouvir o discurso certo, ler o livro indicado, andar na escola correcta. E, desde já to digo, Leitor, que os Talibans não são só muçulmanos. Não. Em todas as religiões há Talibans. Mais. Os Talibans estão longe de se manifestar apenas na vida religiosa. Em todos os sectores da actividade humana há Talibans. Nunca ouviste, Leitor, um economista dizer, contra toda a evidência, que o Mercado resolve todos os problemas?
A Educação em Portugal é dominada, desde há muitos anos, por Talibans. A coisa passou-se assim: Como em todos os sectores, sempre houve na Educação pessoas que não gostavam do que faziam, que não tinham paciência para os alunos, que eram professores porque era o emprego que tinham mais à mão, ou apenas porque sim. Muitas destas pessoas estavam longe de ser estúpidas e perceberam que, movendo os cordelinhos certos, poderiam passar umas temporadas deslocados nos serviços centrais do Ministério da Educação, o que lhes evitava a maçada de terem de dar aulas. Algumas destas pessoas eram ainda menos estúpidas do que as outras e perceberam que, se se tornassem indispensáveis enquanto lá estivessem, podiam lá ficar. Para sempre. Sem terem de aturar alunos. A darem ordens, em vez de as receberem.
E inventaram uma linguagem própria, que só eles dominavam e compreendiam. E enredaram todo o Ministério numa teia que impedia qualquer movimento que não fosse o seu. E, como todos os Talibans, resumiram a sua verdade em Dois Princípios Imutáveis:
Primeiro Princípio Imutável: NÃO HÁ RAPAZES MAUS
Segundo Princípio Imutável: Como dizia um escritor americano que O Bengalão, na sua juventude, lia com frequência, COM OS RECURSOS ADEQUADOS E COM O TEMPO NECESSÁRIO, É POSSÍVEL ENSINAR CÁLCULO DIFERENCIAL A UM CAVALO.
A Lurdinhas, a Taliban de Almofala, é um exemplo acabado deste fundamentalismo. A Senhora tem certezas. A Senhora sabe a Verdade. A Senhora sabe de quem é a culpa. E lançou uma fatwa sobre os Professores.
Nas cabeças destes iluminados, como não há rapazes maus e toda a gente é capaz de aprender tudo, a culpa da indisciplina na Escola e do insucesso dos alunos só pode ser dos Professores. Acham eles que os meninos podem ser ensinados sem terem de fazer esforço nenhum, que tudo numa sala de aula se pode resumir a uma eterna sessão de brincadeira. Defendem também que os processos mentais que fazem de um ser humano um ser humano esclarecido e capaz são de categorias hierarquicamente diferentes, em que o que eles chamam raciocínio é a zona nobre e o que eles chamam memória a zona brutal que devemos evitar a todo o custo desenvolver.
Nenhuma destas posições tem o mínimo fundamento teórico ou pragmático. São uma questão de fé.
A realidade, no entanto, não se compadece com crenças fantasistas. E, se a frase do Padre Américo exprimiu a generosidade e o amor de um homem bom, a mesma frase, na boca de uma Ministra da Educação, não revela nem generosidade nem amor. Revela apenas incompetência. Porque o mínimo que se exige a um ministro é que reconheça a realidade. E ele há rapazes maus.
Há mesmo rapazes maus que são perigosos. Não, Leitor. O Bengalão não se refere aos rapazes que levam as suas naifas para a Escola. Refere-se a outros, também eles individualmente perigosos e colectivamente catastróficos. Trata-se daqueles rapazes, e raparigas, filhos daqueles senhores que O Bengalão tem por vezes encontrado por aí, que se julgam endinheirados e que, depois de passarem uma semana numa praia para turistas no litoral brasileiro, com manhãs de praia, tardes de cerveja e noites de forró, dizem aos amigos: este ano vamos para Cabo Verde. O Brasil já conheço. Cada mulata, pá! Ih, Jasus!
Estes rapazes são perigosos porque são educados pelos paizinhos, que são umas bestas. A única maneira de os domar é dar poder às Escolas e autoridade aos Professores. E a Lurdinhas diminui um e outra. Ao impedir as Escolas de tomar medidas disciplinares, ao ter um discurso de humilhação permanente para os Professores, que são por ela tratados como se fossem um bando de ignorantes preguiçosos, a Lurdinhas é responsável por uma calamidade que, se não foi criada por ela, foi por ela agravada. E recordemos que a Lurdinhas quer que os Professores sejam avaliados por estas barrigas bronzeadas.
O Bengalão está longe de pensar que todos os Professores são competentes e dedicados. Não são. E uma parte da responsabilidade disso é de quem decidiu que podia haver praticamente uma Universidade em cada aldeia de Portugal. De quem permite que um cidadão possa passar para o 10º ano com negativa a matemática, fazer os três últimos anos do secundário sem essa disciplina, entrar em certas Escolas Superiores de Educação, ter um semestre de matemática nos quatro anos de estudo e, depois, dar aulas, entre outras coisas, de matemática. Ou seja, do Ministério da Educação.
É por isso que O Bengalão pensa que a Lurdinhas, a Taliban de Almofala, é inocente como todos os Talibans. O que está longe de a tornar menos culpada.

sábado, 15 de março de 2008

Greve da Função Pública

Parece que a Função Pública esteve em greve. O Bengalão diz parece, porque, ausente no estrangeiro, só soube do que se passou pela comunicação social. Ora que diz a comunicação social? Diz esta coisa espantosa: que o Governo afirma que a adesão à greve foi de 5,3% e que os Sindicatos informam que 70% dos trabalhadores participaram no movimento. E, sobre a taxa de participação, mais não disse a comunicação social. Estás tu, Leitor, a perguntar-te como é que o Bengalão, este cultor da precisão da linguagem, diz que esta situação é espantosa. Espantoso, que os Sindicatos asseverem que foram 70% os participantes? Espantoso, que o Governo jure que foram apenas 5%? Espantoso? Oh, Bengalão, que inocência!
Pois não faças juízos precipitados, Leitor, porque, nestas notícias, outra coisa há de mor espanto, como diria o Vate. (Não, Ingenhêro, não é a VAT, pergunta ao Carrilho, ele conhece). A primeira coisa que pode parecer espantosa é a diferença entre os números. Não é, no entanto, de estranhar. Tanto os Sindicatos como o Governo, ao indicarem um número, fazem-no apenas como o vendedor de tapetes faz ao turista que cruza as suas arenosas plagas. Quando lhe pede 20000 piastras pelo tapete, o custo de produção, os custos agregados, as margens de lucro, a internalização de factores externos, tudo isso é absolutamente irrelevante. A única coisa que conta é a seguinte: o mercador observa, com um olho semicerrado e escondido atrás da barba pujante, a cara do promitente comprador e, murmura, de si para consigo, na puridade do seu peito tratado a tâmaras e tempestades de areia: quanto é que este infiel é capaz de esportular para ficar com esta merda? E pede o dobro. Assim fazem os Sindicatos e o Governo. O Bengalão, com todo o cinismo de que é capaz o espírito científico, conhece bem o princípio da Rasoira de Occam. E sabe, portanto, que nenhum deles diz a verdade. E que esta se situa algures, entre uma cifra e outra.
Há outra coisa que o Bengalão sabe. Ao ouvir o porta-voz do Governo responder aos jornalistas sobre a adesão à greve, não conseguiu o Bengalão deixar de pensar nos magníficos beduínos das histórias de Tintin. Quando o turista lhes pergunta quanto custa o tapete, eles puxam de sob a jilaba encardida, de números sobre tudo, os filhos incontáveis, as mulheres que o Profeta permite, a velha mãe cega, viúva e faminta, o aumento do preço da alimentação dos camelos, os custos da globalização e a última visita da Al-asai. Tudo, menos o custo do tapete. Assim fez o porta-voz do Governo. À pergunta simples: qual foi a adesão à greve, ele respondeu com números sobre tudo, sobre a quantidade de hospitais encerrados, sobre o número de guichets da Segurança Social que estavam a funcionar, sobre quantos gabinetes ministeriais continuaram a produzir furiosas reformas, sobre tudo menos a adesão à greve.
A matemática tem destas coisas. O Bengalão explica devagarinho, como se o Leitor fosse Licenciado pela Universidade Independente. Em casa do Bengalão, o jantar é normalmente a dois. Um faz o arroz, o outro frita os carapaus, um vai lavando a loiça, o outro limpa-a, enquanto vão ambos pondo a mesa e discorrendo sobre coisas interessantes. Imagine-se que, um dia, o Bengalão faz greve à cozinha. Das razões que o Bengalão tem ou não tem para esta acção reivindicativa nada saberás, Leitor, que a boca do Bengalão é um túmulo. Mas faz greve. A cozinha funciona, nesse, dia, com metade dos seus trabalhadores. Lá se fritam os carapaus, o arrozito sai, talvez o sorriso não seja tão bonito como costuma, mas a cozinha funciona. Qual é a taxa de adesão à greve? O Bengalão responde e o Ingenhêro pode assinar por cima: 50%. Na cozinha do Bengalão trabalham dois, um fez greve, o outro não (e ainda bem, que o Bengalão é de muito alimento), metade aderiu, quem diz metade diz 50%. Qual seria a resposta do porta-voz? Seria simples. Que 100% das cozinhas tinha funcionado. Logo, que a adesão tinha sido de 0 (zero) por cento.
Conta-se na Beira que havia um homem que todas as noites, depois da ceia, punha o chapéu e saía, mesmo quando o tempo estava mais para o borralhento do que para o luarento. A mulher, por vezes, quase por desfastio, perguntava-lhe: E tu, para onde vais, homem, nesta noite de lobos e neve buraqueira? O Homem respondia, invariavelmente e com um sorriso nos lábios: Ora lá, vou ter com a minha amante!
Só vinte anos depois a mulher descobriu que era verdade, que isto de nas terras pequenas tudo se saber foi uma mentira que nós, os de lá, inventámos para enganar os Lisboetas.
Foi isto que fez o porta-voz. Com a verdade nos enganou.
O Bengalão é o primeiro a reconhecer que a conversa vai longa e ainda o Leitor não descortinou motivo de espanto. Pois não disse o Bengalão que havia uma coisa espantosa? E onde está o espanto? Em que o Governo minta? Será lá a primeira vez? Então não disse o Governo que... e depois foi-se ver e...? (Aqui o Bengalão deixa à rua consideração a escolha dos exemplos que são muitos e variados). Donde vem o espanto do Bengalão?
Já devias ter aprendido, Leitor, a estar mais atento ao que diz o Bengalão. O Bengalão repete o que disse, exacta e precisamente: Ora que diz a comunicação social? Diz esta coisa espantosa: que o Governo afirma que a adesão à greve foi de 5,3% e que os Sindicatos informam que 70% dos trabalhadores participaram no movimento. E, sobre a taxa de participação, mais não disse a comunicação social. O Bengalão já teve ocasião de te dizer, Leitor, que o homem avisado está mais atento ao que se não diz do que ao que é dito. Que o Governo tenha mentido não causa espanto ao Bengalão. E os Sindicatos, e os Sindicatos, pergunta o Padre Miguel Sousa Tavares ou outro Savonarola de serviço? O Bengalão reponde que não tem nada com isso. Os Sindicatos mentem ao Bengalão? Talvez, e depois? Os Sindicatos são associações privadas, constituidas para defenderem os interesses sectoriais dos seus membros, o Bengalão não é membro de nenhum Sindicato, nem sequer tem a honra (e o proveito duvidoso) de pertencer à Função Pública portuguesa e, portanto, se este Sindicato lhe mentir, o Bengalão limitar-se-á a não o convidar lá para casa nem para com ele tomar café na Benard. Temos assim, pois, que a afirmação dos Sindicatos deixam o Bengalão de mármore, como a Lurdinhas. Não lhe causa nenhum espanto.
O que causa o espanto do Bengalão (por falar nisso, O Bengalão ouviu no outro dia um debate sobre o momentosíssimo assunto do regime, monárquico ou republicano, que Portugal devia ter e decidiu que, a partir de hoje, vai passar a escrever o seu nome com mais respeito e nobreza. Assim mesmo, O Bengalão com maiúscula no artigo), o que causa então o espanto d'O Bengalão?
Pois, caro Leitor, é a última frase citada: E, sobre a taxa de participação, mais não disse a comunicação social. A comunicação social, sobre a taxa de participação na greve, limitou-se a repetir o que disseram Sindicatos e Governo.
Ora, só alguém muito mais ingénuo do que O Bengalão pensaria que a comunicação social o fez porque achou que um dos números era verdadeiro ou por não ter outras maneiras, mesmo penosas, de verificar a verdade. O Bengalão não acredita que, neste país em que floresce a abóbora e o Marcello pensa, neste país em que pululam Miguéis, e Vascos, e Sousas, e Pulidos, e Tavares e Valentes, neste país em que, por trás de cada jornalista de caneta embotada e monco caído, transparece, magnificamente, o olhar agudo e fino de um romancista genial, a comunicação social, ao acentuar, com o seu silêncio gritante, a diferença dos números, tenha querido outra coisa que não fosse dizer-nos tão-só e gloriosamente, a diferença dos números. Ou seja, a notícia que a comunicação social quis publicar foi, não o número de adesões, mas a diferença entre as afirmações do Governo e dos Sindicatos.
Tem a comunicação social o direito de dar esta informação? Claro que sim. Tem a comunicação social o dever de procurar também dar a outra? É a contrapartida da liberdade de imprensa. Uma comunicação social que não procura informar não merece existir. Qual é então razão da atitude da comunicação social? Pois, caro Leitor, é o vil metal. Os jornais vendem mais exemplares, as estações de televisão e rádio mais espaço publicitário se, em vez de noticiarem a verdade proba e lhana, noticiarem o abismo, a fossa, o Mindanau que separa as duas posições.
Só que O Bengalão, que paga o Governo, e que paga também a estes trabalhadores concretos, tem o direito de saber a verdade. Ou pelo, menos de que os seus empregados que ocupam as transitórias cadeiras do poder executivo, não lhe mintam. Que lhe digam, de olhos baixos e de chapéu na mão: Pois, Patrãozinho, não sabemos, as contas são difíceis, o choque tecnológico ainda não deu os seus frutos, os Serviços dos Ministérios, como não são alunos do décimo ano nem Professores, graças a Deus, ainda não têm computadores, pois o Patrãozinho há-de perceber e desculpar. Isto diria o Governo, se o Ingenhêro não tivesse faltado às aulas da catequese. E O Bengalão, magnânimo, perdoaria.
Ora O Bengalão tem uma solução para esta problemática. (Deve ser esta uma das poucas vezes em que a palavra problemática, como substantivo, foi usada por escrito no seu verdadeiro sentido). E uma solução moderna, que diz O Bengalão, pós-moderna. Com uma parceria público-privado, com externalização funcional e tudo. Não se admirava O Bengalão se, depois deste texto, recebesse um SMS do Ingenhêro a perguntar: Que pasta prefere Vossa Excelência? Na próxima remodelação é sua. (E a Excelência seria a d'O Bengalão).
Resumamos os problemas:
1-O Bengalão tem o direito de ser informado sobre a taxa da adesão à greve;
2-O Governo mente-lhe;
3-Os Sindicatos mentem-lhe;
4-A comunicação social não lhe diz a verdade.
5-A comunicação social ganha dinheiro com este exercício.
A solução é simples e elegante. Estabeleça-se uma Fundação, um Observatório da Adesão aos Movimentos Grevistas. Para a Presidência do Conselho de Administração, convide-se uma personalidade de reconhecida probidade e independência, por exemplo o Dr. Vitalino Canas. (No fundo, se há tantas fundações dirigidas por vitalinas, porque não uma dirigida por um Vitalino?). Esta Fundação encarregar-se-ia de fazer, à mínima greve, as investigações necessárias para determinar a taxa de adesão. Entretanto, os jornais, as televisões, os rádios, o próprio Marcello, tornariam públicos números, todos falsos, cada um mais fantasioso do que o outro, dizendo O Público, por exemplo, na primeira página: Sindicatos referem taxa de adesão recorde de 121%. Governo confirma que até os grevistas fizeram serão.
A Fundação calcularia, entretanto, a subida de audiências ou de tiragens produzidas por estas parangonas. E, desse valor acrescentado, 50% serviria para financiar a Fundação. Quem quisesse saber a verdade, O Bengalão, por exemplo, ia à página do Observatório na rede e obtinha o número. Sem espinhas.
A máquina de calcular, essa, seria paga com dinheiros do Quadro Comunitário de Apoio.

segunda-feira, 10 de março de 2008

Educação

Estamos todos de acordo. A Educação está muito mal. A maior parte dos portugueses não sabem falar, sabem ainda menos escrever, não são capazes de fazer uma conta simples sem uma calculadora e, mesmo com ela, se por acaso se enganam num algarismo, não dão conta, porque não fazem a mínima ideia do resultado aproximado. Além disso, não sabem História, não têm a menor ideia de Geografia, não conhecem um único pintor, ou escultor, ou músico. Também nunca leram um livro do princípio ao fim. Como se isto não bastasse, confundem alegremente conceitos básicos muito diferentes. Acham que simples é sinónimo de fácil, e complicado de difícil. Não distinguem impossível de improvável, provável de possível. A sua única ética é a Lei, no sentido mais boçal do termo. (Uma coisa é imoral se, e só se, a polícia os apanhar em flagrante delito). E isto aplica-se tanto ao carteirista do Rossio como ao presidente do conselho de administração. A Educação está muito mal, portanto.
O Bengalão diz desde já que a culpa não é do MINED. E não é, porque o sistema educativo está longe de ser o único veículo de transmissão de ideias, de técnicas de formação de opiniões próprias, de factos brutos e de comportamentos. Nem sequer é, provavelmente, o mais importante destes veículos. Um Ministétio da Educação que compreendesse isto, exigiria que lhe mudassem o nome. Que lhe chamassem Ministério da Instrução, por exemplo. A educação dos portugueses faz-se, fundamentalmente, pela televisão. É isto um exagero? Será. Mas num país em que se passa tanto tempo à frente da TV, é natural que esta seja, não só a principal fonte de informação, mas também o principal modelo de comportamento. Outra coisa não seria de esperar.
É ou não verdade que os adolescentes portugueses passam, por dia e em média, 4 horas na internet, sem o acompanhamento de um adulto, mesmo de um adulto sem conhecimentos específicos para orientar a sua formação? E o que é que o adolescente faz na internet, pergunta o Bengalão. E responde já. Educa-se. Ou seja, recebe ideias, toma conhecimento de factos, constroi as suas opiniões e modifica os seus comportamentos. Sem acompanhamento.
Quer isto dizer que devemos pôr um especialista atrás de cada jovem que vai à net? Concerteza que não. Mas chamar a um Ministério que ignora estes factos Ministério da Educação só pode ser uma piada de mau gosto.
O Ingenhêro declarou há uns meses que daria um computador a cada aluno do secundário. (Esqueceu-se de dizer que o fez provocando o gáudio dos pingues lucros de algumas empresas de telecomunicações e informática, mas isso são contas de outro rosário). É uma medida boa? É uma medida má? O Bengalão não sabe. Um computador é apenas um meio, não é um fim. E o Ingenhêro esqueceu-se de nos dizer qual era o objectivo. Ou seja, que competências espera o Ingenhêro que TODOS os alunos que saiem do Secundário tenham, no que diz respeito à informática.
Tudo no discurso do MINED é do mesmo jaez. Não disse a Lurdinhas, há meses, que, agora, o problema das instalações físicas das escolas está resolvido? Não é verdade que uma parte significativa das escolas portuguesas não têm instalações desportivas? Não interessa, Lurdinhas dixit Gosta o Ingenhêro de apontar a Finlândia como exemplo de sucesso educativo. Pois na Finlândia, uma das aulas obrigatórias do princípio ao fim do ensino obrigatório é uma coisa a que eles chamam, barbaramente, Urheilu. Se o Ingenhêro soubesse Finlandês, saberia que o Bengalão, este vaidosão que dá cinco tostões (e basta) para mostrar que sabe, está a falar de desporto. Já ocorreu à Lurdinhas que a generalização da prática sistemática de desportos colectivos em TODAS as escolas colaboraria para fomentar o espírito de corpo da escola, o espírito de equipa do aluno, o espírito de sã concorrência do cidadão?
Há estudos que mostram uma ligação entre a educação musical temporã e a qualidade dos resultados em matemática. Os japoneses e os coreanos, por exemplo, levam-nos muito a sério e estão à frente nos testes de numeracia. O que faz a Lurdinhas? Acaba com a pouca educação musical séria que existe no país. (O Bengalão não está a falar daquelas senhoras gordas e com pouco ouvido que ensinam as inínclitas gerações a cantar "Atirei o pau ao gato").
A Educação está mal em Portugal. Mas não fazer nada por isso, não reconhecer que há problemas de fundo que vêm de há muito tempo, que não fomos capazes, nós todos, de acompanhar a evolução da sociedade com mudanças das nossas (e não só da Escola) estratégias educativas tem um nome: incompetência. Dizer que tudo é simples e que a culpa é dos Professores tem outro nome: canalhice.
PS: O Bengalão agradece aos Professores que estiveram na manifestação de Sábado. E pareceu-lhe apropriado que, no dia 8 de Março, a maioria parecessem ser mulheres.

sábado, 8 de março de 2008

Fascismo

O Sr. Santos Silva foi a Chaves. O Sr. Santos Silva foi recebido com apupos e com gritos em que, entre outros mimos, lhe chamavam fascista. O Sr. Santos Silva declarou que aquilo era tudo organizado pelo Partido Comunista e que "aquela gente" (sic) não distinguia entre Salazar e um democrata. E disse que, se calhar, "aquela gente" não tinha lutado pela liberdade nem antes do 25 de Abril, nem no Verão Quente. (O Bengalão confessa que acha alguma piada a que um Ministro pergunte aos cidadãos em nome de quem governa, quando estes lhe dizem, talvez não com a meiguice que o mimoso governante esperaria, que acham que ele não serve, onde estavam no 25 de Abril)
O Bengalão gostava de dizer quatro coisas ao Sr. Santos Silva:
1- No 25 de Abril, o Sr. Santos Silva tinha 18 anos. Dificilmente terá sido um heroi da Resistência. Porque não pôde. Ai, se tivesse podido... Até a cadeira do Salazar teria tremido.
2- O Sr. Santos Silva diz que quem garantiu a liberdade nos anos 7o foi o PS. O Sr. Santos Silva aderiu ao PS em 1980. O Bengalão não fará ao Sr. Santos Silva o insulto de lhe dizer que aderiu ao exército quando a guerra já estava ganha e o exército distribuia chorudos cargos.
3- Espanta-se o Sr. Santos Silva por os manifestantes confundirem Salazar com os democratas. Ora nenhum manifestante chamou fascista aos democratas. Os manifestantes chamaram fascista ao Sr. Santos Silva.
4- Uma semelhança entre o Sr. Santos Silva e Salazar é que também ele, à mínima contestação, dizia que era tudo organizado pelos comunistas.
O Bengalão não sabe se há outras semelhanças. Mas, para aquilatar da honestidade intelectual do Sr. Santos Silva, e considerando que se tratava de uma manifestação de Professores e o Sr. Ministro citou tês democratas a quem todos devemos muito, Mário Soares, Salgado Zenha, Manuel Alegre, gostava de saber se o Sr. Santos Silva se deu ao trabalho de perguntar aos dois que ainda estão vivos o que pensam da política de Educação do Governo a que pertence.

Segurança Interna

O MAI publicou os últimos números que provam, à saciedade, que a criminalidade tem vindo a descer nos últimos anos. Há um ano, dois partidos da oposição, considerando que a criminalidade estava a aumentar, propuseram que se aumentasse o número de polícias. O Governo disse, na altura, que se tratava de uma manobra de populismo inaceitável, que não era necessário contratar mais polícias, que tudo estava bem, que para vivermos na Finlândia, só nos faltava a neve e chamarmos, como o faria o Ingenhêro se falasse Finlandês, às auroras boreais revontullen.
O Bengalão acredita piamente no MAI e nos seus relatórios. O Bengalão não põe as mãos no fogo nem pelo capachinho do Paulinho nem pela melena farta do MM (alguém se lembra dele?). O Bengalão acha, portanto, que é possível que o MAI tivesse toda a razão em não aceder às pretensões de tão sinistras personagens.
Entretanto, o crime desceu, o que parece dar razão ao MAI. Tudo está, portanto, bem. Poupam-se assim alguns euros e mostra-se à população que o MAI vela port nós e, ainda por cima, é poupada.
Mas, e em todas as histórias há um mas, se o crime desceu, alguns crimes aumentaram. Coisas de pouca monta. O assassínio de mais alguns seguranças. O car-jacking, como diria o Ingenhêro se soubesse falar português, os assaltos violentos. O que fez o MAI? Mais rápido do que a sua própria sombra, o MAI anunciou a contratação de mais polícias. Por acaso, o mesmo número que a oposição tinha proposto há um ano.
O Bengalão acredita em coincidências, com os limites do bem senso. Mas há alguns elementos de perturbação. Os números redondos perturbam o Bengalão. O número de polícias necessários são exactamente 2000. O Bengalão, este cínico, desconfia. Por que não 1998, ou 2002? Mas possível, é.
Agora, o que o Bengalão acha impossível de explicar pela coincidência é outro elemento. Expliquemo-nos por pontos:
1- O número de crimes desceu.
2- Por isso, há um ano, não eram precisos mais polícias.
3- O número de crimes continuou a descer.
4- Apesar disso, alguns tipos de crime aumentaram.
5- Todos estes crimes têm uma característica comum: são tipicamente urbanos.
6- Ou seja, da alçada da PSP.
Na sua proverbial modéstia, o Bengalão teria deslocado alguns membros da GNR para a PSP. Era mais barato e correspondia ao discurso do Governo sobre a evolução do crime em Portugal.
A não ser que a explicação seja outra. Que os números não sejam verdadeiros. Ou que a segurança subjectiva tenha levado o MAI a uma acção de propaganda hedionda. Ora qualquer agência de publicidade explicará a importância dos númeos redondos nas acções de propaganda. Ligando os dois elementos, o Bengalão ficou mais do que desconfiado.
E que ninguém diga que o Bengalão está a ver fantasmas onde os não há. Não seria a primeira vez que o Ingenhêro y sus muchachos usam a verdade com a flexibilidade de um contorcionista. E a propaganda parece ser a sua grande especialidade.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Sucesso Escolar

Hurrah! Hurrah! Hurrah! O insucesso escolar desceu! O abandono escolar desceu! Yuppi! Tervetuloa Suomeen, como diria o Ingenhêro se falasse finlandês.
Agora, que o Bengalão já deu os vivas necessários, vejamos bem o que estamos a dizer. Há menos insucesso escolar este ano do que no ano passado. Muito bem. Há menos abandono escolar do que no ano passado. Melhor ainda. Mas, e aqui o Bengalão faz uma pergunta séria, o que é o abandono escolar? É o mesmo que era o ano passado? Ou, ditas as coisas de outro modo, quando se diz que há menos abandono escolar está-se mesmo a dizer que diminuiu a percentagem de alunos que frequentavam regularmente as aulas e deixaram de o fazer? Ou está-se simplesmente a dizer que, tendo a Lurdinhas decidido que as faltas deixam de contar, um aluno só abandona a escola no dia em que morrer ou fôr eleito deputado? Do mesmo modo, quando se diz que diminuiu o insucesso escolar, está-se a dizer que há uma percentagem menor de alunos que terminam o primeiro ciclo sem saberem ler e escrever e sem manejarem as quatro espécies? Porque, se não é isso (e os equivalentes para os outros ciclos) que se está a dizer, não estamos a falar de estatística, estamos a falar de propaganda. E o Bengalão tem pouca paciência para a banha da cobra.

sábado, 1 de março de 2008

Mea culpa

Muito tem o Bengalão zurzido a Lurdinhas. Mas ontem, ia o Bengalão a caminho de Damasco, quando surge, de uma nuvem quase sólida, a voz tonitroante de uma personagem de barbas que é por todos na Europa, como já tinha sido em África, considerado Modelo da Honestidade, Paradigma da Cultura, Prócere da Sensatez, Símbolo da Temperança, Arauto da Concórdia e vendedor de electrodomésticos. Compreenderás, Leitor, que, principalmente naquelas zonas, mesmo a coragem do Bengalão sofra algum abalo. Troou a Voz: "Bengalão! Oh Bengalão!". O Bengalão, aterrado, mal ciciou: "Quem me chama?". E a Voz: "Oh Bengalão, tu não te faças parvo! Não sabes então quem Eu sou?" Palavra de honra que se ouvia "Eu" com maiúscula e tudo. "Não sabes, Bengalão? Não te diz nada, Gondomar? A Manutenção Militar, nada te diz? Esqueces a Bola, os Apitos? Não te lembras dos aspiradores e da pesca na Guiné? Não sabes quem Eu sou, Bengalão?" E o Bengalão, cá de baixo: "Sei..." Torna a Voz: "Pois a Lurdinhas está a trabalhar muito bem, é uma mulher de coragem, eu próprio não faria melhor, ela e Eu somos a encarnação do mesmo, uma palavra contra ela é uma palavra contra Mim." A Voz arremessava maiúsculas como bombas. "Bengalão, que te não oiça Eu outra vez a vociferar contra ela, que é, repito, vociferar contra Mim."
O Bengalão declara, portanto, que a Lurdinhas é uma excelente Ministra. É Ele quem o diz.