quinta-feira, 25 de setembro de 2008

casamento de homossexuais

Quase não se fala de outra coisa: querem uns que se permita o casamento entre homossexuais, defendem outros que isso seria uma violação intolerável dos princípios éticos da esmagadora maioria da população portuguesa. O Bengalão, que é um cínico, sabe bem por que é que a oposição quer discutir o assunto agora: aproximam-se as eleições e o Paulinho quer ir pelas feiras a dizer a quem o quer ouvir, ele até quer deixar casar as … (O Bengalão recusa-se a repetir a palavra que o Paulinho usará). A Contabilista, Morgada honorária, quer poder dizer, perante clarissas e carmelitas em delírio, com a lógica que aprendeu nas matemáticas gerais, que o casamento serve para a procriação e, assim sendo, para que querem eles, elas, casar?
À esquerda, o que querem é poder dizer, vejam o Ingenhêro, esquerda aquilo, então não vê ele o que se passa na Espanha, em que os socialistas ainda o são, estes não, são de direita e devem ser combatidos. (É preciso dizer que o Geronimo, neste debate, se escondeu atrás dos Verdes, como o Herman José na rábula do National Geografic, escondido, mas com o rabo de fora, se, num debate destes, a expressão é permitida. O Ingenhêro, a única coisa que quer é que nada nem ninguém se lembre sequer de discutir a questão, como o Jô Soares, num programa de há uns anos, dizia, à saciedade: “Não me comprometa!” E vai de dizer que a questão não será discutida porque o PS não tem um mandato do eleitorado. Aplausos para o Ingenhêro! Desfraldem as flâmulas! Puxem o brilho às trombetas! Mandem já vir o … O PS não discutirá nada sem ter um mandato do eleitorado e, nos Passos Perdidos, corre, cada vez mais insistente, o boato de que o Ingenhêro, depois de se ter confessado ao Padre Melícias, vai promover a repetição do debate sobre o Tratado de Lisboa, para cuja ratificação não tinha mandato, este pelo contrário.
Mas O Bengalão, caro Leitor, não foge à discussão. Vamos a ela, portanto. O primeiro ponto interessante é que ninguém põe em causa o casamento de homossexuais. O Bengalão conhece vários homossexuais que são, ou foram, casados e O próprio Bengalão, que casou, não se recorda de ter ouvido o senhor conservador perguntar-lhe se era homossexual. É certo que nesse dia (e em muitos mais dias) O Bengalão estava demasiado ocupado a olhar para a pessoa que estava ao seu lado para recordar, como se fosse o Magalhães, tudo aquilo que o representante do Estado disse. Mas não deu fé. Por outro lado, numa sociedade em que cada vez mais crianças nascem sem que os pais partilhem a vida no quadro de uma família, há cada vez mais mulheres que criam, cuidam, educam os filhos sem a participação dos pais. Algumas destas mulheres são homossexuais. Algumas delas vivem com pessoas do mesmo sexo, de uma maneira que ambas querem permanente. Ninguém defende, que O Bengalão saiba, que o Estado retire essas crianças da guarda dessas mulheres. Ora O Bengalão acha que o Estado, se pensasse que as crianças corriam algum risco, não deixaria de o fazer. Segue-se que o Estado não considera que venha ao mundo algum mal, ou que seja prejudicial para as crianças, que uma família possa ser constituída por duas mulheres, homossexuais, que exerçam o poder parental sobre uma ou mais crianças.
O Bengalão interrompe para um esclarecimento que pode ser útil. O Bengalão não é homossexual. É casado, há 35 curtíssimos anos, com uma pessoa de sexo deliciosamente diferente do seu. Mesmo tendo ouvido dizer, e, em tese, não tendo argumentos para rejeitar a asserção, que toda a gente, incluindo O Bengalão, tem, mesmo que dormentes, tendências homossexuais, O Bengalão confessa que nunca sentiu o irreprimível desejo de cobrir de beijos o Nelson Évora nem, perante a profundidade de uns certos olhos castanhos, lhe apeteceu pousar a mão marota numa coxa cabeluda. Ce n’est pas trop tard, como diria o Ingenhêro se tivesse tido uma educação esmerada, mas, mesmo assim, enquanto o pai vai e vem, folgam as costas.
Finda a interrupção, e definido O Bengalão como parte não interessada do problema, pensemos: o que é o casamento? Um sacramento? O acto básico da sociedade humana? Um passo essencial para a procriação digna? Uma convenção? Um contrato? A resposta parece simples a’O Bengalão. O casamento é isto tudo. E muito mais. Às vezes, o casamento é isto tudo ao mesmo tempo, às vezes apenas uma destas coisas. Mas pretender, num país em que, arriscar-se-ia O Bengalão a afirmar, mais de 50% das quecas são dadas fora do matrimónio, em que uma parte significativa dos filhos vive só com o pai, ou só com a mãe, ou com qualquer dos dois mais um número indeterminado de tias, tios e ofícios correlativos, só o casamento como Diós manda, como diria o Dr. Mário Soares se soubesse falar Castelhano é que deve ser reconhecido pelo Estado é tapar o Sol com a peneira. O Estado não tem nada com a qualidade que eu atribuo ao meu casamento. Se eu acho que é um sacramento, é um sacramento. Se eu acho que não devo ter filhos fora dele, não os tenho. Se eu acho que devo casar por amor, pois que case. Se quiser casar porque me convém, benvindo à equipa dos casados. O Estado é que não tem nada com isso. Cumpre ao Estado, apenas, defender aqueles que são frágeis (não permitindo o casamento de menores, por exemplo), ou não permitir o tratamento indigno de uma das partes (proibindo, por agora, a poligamia, por exemplo). Mas não me diga ao Estado o que devo fazer com a minha vida privada. O Estado quer promover, por razões que são as suas, o casamento? Pois que o faça, garantindo privilégios a quem deu esse passo. Mas é o cidadão, e não o Estado, quem deve decidir com quem partilha a sua vida, a sua cama (ou o chão da cozinha, ou a mesa da sala de jantar) e as suas fazendas. Se o cidadão decidir comunicar ao Estado: “Excelentíssimo Senhor Estado: Comunico a V. Excia que, a partir de tantos de tal, às tantas horas, partilharei a minha vida com…, livre, maior de idade na posse das suas faculdades. Segue-se a assinatura dos dois, das duas, dela e dele, ou seja lá o que for”. Que tem O Bengalão com isso? E pronto, ei-los casados. O Estado que o registe. Se os nubentes quiserem fazer juras eternas, cerimónias religiosas ou cantar loas ao Grande Arquitecto do Universo (Não, Ingenhêro, não é o Tomás Taveira), é lá com eles.
O Bengalão, homem civilizado que tem muitos e variados amigos, não vê diferença entre o casal que formam os seus amigos A. e B., ambos homens e casados segundo a Lei do país em que vivem, ou C. e D., ambos homens, que juntaram os trapinhos sem dizerem água vai, ou E. e F., mulher e homem, profundamente crentes, casados numa cerimónia para eles sagrada.
E, francamente, o facto de, quando G., amigo d’O Bengalão, homossexual e já entradote, morrer, o seu companheiro de sempre, que dele dependeu economicamente para viver por razões que aqui não vêm ao caso, ficar na miséria, sem sequer ter metade da casa em que viveram, nem o usufruto dos móveis, nem uma pensão de viuvez não pode deixar de ser visto como uma pulhice.

3 comentários:

popeline disse...

Não sei quem é o Nelson Évora mas estou cheio de vontade de cobri-lo de beijos, irremediavelmente. É uma fraqueza passageira.

Anónimo disse...

Visto assim parece tudo muito fácil. Tenho, contudo, reservas sobre a adopção de crianças por homossexuais homens.

Gostaria de ler a sua opinião.

com senso disse...

Neste caso, e como é habitual, eu não diria mais ou melhor.
E quanto à questão colocada pelo leitor anterior, no que se refere ao tema da adopção de crianças, julgo que em grande medida ela fica respondida através das observações feitas pel' O Bengalão sobre uma realidade que existe na nossa sociedade: Muitos homens e mulheres homossexuais têm filhos naturais e vivem com eles e com os seus parceiros/parceiras.
Caso o Estado não considere aconselhável a adopção por homosexuais deveria, de acordo com a mesma lógica, retirar as crianças a esses pais e essas mães...