domingo, 3 de fevereiro de 2008

Drama em três Actos (e a unidade de tempo que se lixe)

Acto I (há uns meses)
Há eleições "directas" para escolher o lider do PSD. O Bengalão mete as suas primeiras colheradas: por que é que havemos de dizer lider? Ou leader? Por que não Chefe? ou Caudilho? Ou Comandante? E por que se diz eleições directas? Há eleições indirectas? Se eu escolho quem escolha por mim, estou a escolher DIRECTAMENTE quem por mim DIRECTAMENTE escolha! (um quiasmozito de vez em quando sempre dá muito jeito.) Ou não é verdade?
Há então eleições para Luís Filipe. Na televisão, a defender o Luís Filipe mais provável, e que veio realmente a ganhar, aparece um sujeito de que há uns anos o Bengalão se fartou de rir, que encontrou uns pregos num automóvel estacionado perto de uma manifestação e veio para a televisão dizer que tinham sido encontradas armas em poder dos manifestantes.
Entreacto
O tal sujeito, que foi Ministro da Defesa, retirou-se do Governo e passou a representante, em Portugal, de uma grande empresa americana cuja principal actividade é a venda de armas e de que Portugal é fiel cliente.
Acto II (há umas semanas)
Grandes investimentos em Portugal!!! Portugal, que já tem a maior central fotovoltaica do mundo, vai ter a maior central fotovoltaica urbana do mundo!!! Portugal é grande!!! Portugal tem o Cristiano Ronaldo e a Central fotovoltaica do MARL!!! Arraial, arraial!!!
Quem disse isto, por outras palavras, foi o representante em Portugal de uma empresa americana de centrais fotovoltaicas, um sujeito que, porque encontrou uns pregos e vendeu umas fisgas, passa por grande especialista de questões geoestratégicas.
Acto III (há uns dias)
Mudanças no Governo. O Bengalão abre a TV e ouve o tal sujeito das armas fotovoltaicas, ou lá o que é, explicar muito bem por que é que a remodelação tinha sido uma derrota para o Governo do Ingenhêro.
Moral da história
Para que se não pense que o Bengalão não gosta de chamar os bois pelos nomes, o sujeito chama-se Ângelo Correia. E nenhum dos actos acima expostos é ilegal ou duvidoso, sequer. O Senhor Ângelo Correia tem todo o direito de ser Ministro, dirigente partidário, jornalista, vendedor de fisgas e caixeiro viajante.
O que o Bengalão tem o direito de perguntar, nem que seja na sua intimidade (Ai, a intimidade do Bengalão...), à puridade da sua reflexão, é o seguinte: Quando o Senhor Ângelo Correia, dirigente partidário, defende Luís Filipe, quem é que está a falar? Não será o Senhor Ângelo Correia, vendedor de fisgas? Quando o Senhor Ângelo Correia, especialista em geoestratégia, fala na televisão, quem é que está a falar? Não será o Senhor Ângelo Correia, caixeiro viajante? Quando o Senhor Ângelo Correia, jornalista, diz de sua justiça, quem é que está a falar? Não será o Senhor Ângelo Correia, dirigente partidário?
Na última mudança no Governo, a Televisão Pública foi perguntar aos partidos o que pensavam. A pergunta não tinha o mínimo interesse jornalístico. Todos nós sabíamos o que os partidos pensavam. No sentido mais puro da palavra, não era uma notícia, não era uma novidade. Mas, depois, a Televisão Pública foi perguntar aos seus dois comentadores residentes. Sem surpresas, o Senhor António Vitorino disse o que o PS tinha dito e o Senhor Marcelo Rebelo de Sousa o que tinha dito o PSD. Dir-se-á que isto mostra o pluralismo da RTP. Não mostra nada disso. Mostra que, ao fim de décadas, a televisão pública não foi capaz de saír do grau zero do jornalismo: produzir um comentador independente e respeitado. Refugia-se assim no politicamente correcto: pataca a mim , pataca a ti. E continua a mostrar-nos, todos os dias, as mesmas caras, hoje como jornalistas, amanhã como políticos, depois como empresários, no dia seguinte como académicos.
Há uns dias, leu o Bengalão num dos seus blogues favoritos, as minhas leituras, que a crise no BCP não era nova: já vinha nos Maias. Pois o Bengalão também acha que esta omnipresença do mesmo indivíduo com várias caras (eles dizem com várias qualidades, como se o não ter uma só cara não fosse um defeito: pois, eu até respondia a essa questão - para eles, os jornalistas não fazem perguntas, põem questões - mas, como estou aqui na qualidade de ... (sócio do Casa Pia, membro da Cruz Vermelha, cliente da Zara, etc...) não lhe posso responder), já lá vem no Eça: O bengalão cita:
O ministério foi assim constituido:
Presidente do Conselho: Marquês de Ávila e Bolama
Ministro dos Estrangeiros: Marquês de Ávila e Bolama
Ministro do Reino: Marquês de Ávila e Bolama
Ministro da Fazenda: Marquês de Ávila e Bolama, sob o célebre pseudónimo por tantos usado de - Carlos Bento da Silva
Ministro das Obras Públicas: Marquês de Ávila e Bolama, sob o suposto nome de - Visconde de Chanceleiros
Ministro da Justiça: Marquês de Ávila e Bolama, sob o anónimo - Sá Vargas
Ministro da Guerra: Marquês de Ávila e Bolama, sob a denominação inexplicável de - José de Morais Rego.
Acrescente-se a isto o jornalista Marquês de Ávila e Bolama, o comentador político Marquês de Ávila e Bolama, o empresário Marquês de Ávila e Bolama e estaremos muito perto dos dias de hoje.

Sem comentários: