sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

Referendo

Foi hoje a votos, na Assembleia da República, a seguinte questão especiosa: deve o Tratado de Lisboa ser ratificado por referendo ou, pelo contrário, pelos legítimos representantes do povo?
O Bengalão tem, naturalmente, uma opinião sobre o assunto. Não a revela, no entanto. Não vê o Bengalão que importância pode ter o que pensa sobre esta ou outras questões políticas. Diga-se apenas que o Parlamento tem toda a legitimidade para discutir e votar o modo de ratificação. O referendo é tão legítimo, mas não mais legítimo do que a ratificação parlamentar. Tudo o resto é uma questão de opinião e de juditiis non curat praetor, que é como quem diz, o Bengalão não se mete nas opiniões de cada um.
Depois de um debate morno e previsível, naquele tom gordo a que nos habituou o nosso Parlamento, foi a proposta de referendo posta à votação, com o resultado que consta do Diário das Sessões. Alguns Deputados, por razões que uns explicaram e outros não, decidiram votar de maneira diferente da do seu Grupo Parlamentar. O que é um direito que ninguém lhes negará.
Houve um certo número de Deputados, no entanto, que deixaram o Bengalão de castão à banda. Foram uns Senhores que votaram como entenderam e, no fim, declararam esta coisa espantosa:
Nós votámos assim, mas pensamos o contrário. Se votámos como votámos, foi por uma questão de disciplina partidária. O Bengalão traduz: Suas Excelências declaram que, na sua opinião, os interesses superiores do país, a lógica mais primária, a fidelidade mais branda a promessas feitas exige que a decisão seja A, mas que Suas Excelências votam B pela subida razão de terem sido mandados votar B. Ora, quando o Bengalão elege os seus representantes na Assembleia, faz com eles um contrato. O Bengalão dá-lhes um ordenado interessante, mordomias várias, o direito a que os tratem por Vossa Excelência, mesmo os mais burros e a garantia de que, durante 4 anos, o Bengalão, patrão magnânimo, lhes não dará ordens. Eles comprometem-se a puxar, o mais que podem, pelo bestunto, a não abusar demasiado das viagens de favor e a não obedecer a ninguém. O contrato é injusto? Uns dizem que sim, outros que não. Mas é um contrato.
Ora aqueles Deputados, nossos servidores, quase nossos criados, ao declararem que tinham votado conmtra a sua opinião, por estarem às ordens de uns Senhores que o Bengalão não conhece, mostraram que não cumprem a sua parte do contrato e, portanto, não são dignos de nos engraxarem as botas. Se eles ficassem mais um minuto sequer no Parlamento e pudessem, por exemplo, votar o Tratado de Lisboa, o Bengalão não saberia se eles estavam a votar no que pensam ou no que lhes mandam pensar. Mas o Bengalão está certo de que Suas Excelências, depois da declaração que fizeram, enviaram ao Senhor Presidente da Assembleia da República o único documento que pode restaurar a sua dignidade ferida: o seu pedido de demissão.

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