segunda-feira, 31 de março de 2008

Divórcio litigioso

Resolveram alguns Deputados apresentar propostas no sentido de facilitar o divórcio aos portugueses. A situação actual é bem conhecida. Quando uma pessoa casada pretende pôr fim à relação matrimonial, tem hoje duas soluções: ou obtém o consentimento do cônjuge, e ver-se-á divorciada em breve prazo e a custo razoável; ou não o obtém, e terá, para se divorciar, de provar que a culpa da situação é do cônjuge e de pagar muito, em tempo e em dinheiro, para se divorciar.
Esta situação é duplamente injusta. Por um lado, prolonga desnecessariamente situações de conflito que são dolorosas, e, por outro, protegem os fortes. Quer dizer, num casal em que um dos cônjuges tenha rendimentos próprios e o outro não, ou se houver uma diferença muito sensível entre os dois, o mais rico pode, e muitas vezes fá-lo, prolongar quase indefinidamente os processos, tornando a vida do outro num inferno.
O Bengalão não conhece os projectos em discussão. Não sabe, assim, se alguns problemas são correctamente tratados. Mas sabe que, em princípio, o objectivo deles é justo e corresponde a uma prática social que tem feito com que o casamento já não seja a única maneira de constituir uma família e seja mesmo cada vez menos o acto constitutivo de uma família. Cada vez há mais pessoas que não consideram que o casamento seja uma condição prévia para duas pessoas iniciarem uma vida em comum. Cada vez menos pessoas consideram, assim, o casamento como acto fundador e sagrado.
O Bengalão tem a sua opinião. Mas trata-se de uma questão que é do domínio privado de cada um. A opinião d'O Bengalão não tem qualquer interesse, a não ser para si próprio e para a pessoa com quem partilha, e tem toda a intenção de continuar a partilhar a sua vida. Não tem interesse a opinião d'O Bengalão nem a de ninguém. Que o Estado deve proteger e salvaguardar o direito de alguns cidadãos, que acreditam que o casamento é sagrado, de celebrarem o matrimónio de acordo com essa crença é uma evidência. Que o Estado, ou seja quem fôr, tenha o direito de definir as condições da dignidade do casamento seria um desvio intolerável.
Ora a Igreja Católica entendeu pronunciar-se sobre o assunto. Tem a Igreja o direito de se pronunciar? Claro que sim. Desde que aceite as condições que governam a convivência num Estado de Direito. Ou seja, que a Igreja Católica aceite que deve, e pode, informar os seus fiéis das condições em que considera que eles podem casar ou separar-se. Se a Igreja Católica acha que os noivos, para casarem devem fazer o pino diante da Sé de Lisboa, pode e deve dizê-lo. Se a Igreja Católica acha que, para um casal se separar é necessário que um dos cônjuges seja Príncipe do Mónaco, pode e deve dizê-lo. O que a Igreja Católica não pode, nem deve, é tentar fazer com que o Estado consagre na Lei as crenças do Senhor Ratzinger. Para os Católicos, as crenças deste estimável Senhor são a Verdade com letra grande. Para O Bengalão, e para o Estado laico, as crenças do Senhor Ratzinger são do domínio estritamente privado.
Mas a Igreja Católica não aprende. Mesmo depois de séculos a tentar que toda a gente pense como ela, com resultados que, felizmente, estão longe de ser muito bons, ainda não aprendeu.
Ora meta-se a Igreja Católica na sua vida e deixe o governo da vida comum de todos os cidadãos a quem estes decidirem. Continue a Igreja a dizer aos seus membros as suas regras, mas deixe os outros cidadãos em paz. O Bengalão está farto de quem, em nome da iluminação divina pretende que a sua Ética é superior à ética d'O Bengalão, que os seus Princípios são superiores aos princípios d'O Bengalão, que a sua Moral é superior à moral d'O Bengalão.
E, por uma vez que o Ingenhêro assina um projecto de jeito, se é que o projecto é dele, deixe o homem trabalhar.

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